Marat e Zeca

As fotografias Marat e Zeca refletem uma certa morte do espírito revolucionário – da revolução francesa de 1789 ao 25 de Abril de 1974. Tirando partido do potencial simbólico das imagens, as imagens ancoram-se em dois grandes ícones, ícones da política como da arte.

Na história das imagens o evocativo quadro pintado por Jacques Louis David La Mort de Marat (1793, 165 x 128 cm) tem o sentido de idealização do mártir da revolução enquanto nos mostra um belo Marat “Ami du Peuple” assassinado no seu banho. Em contraponto, na fotografia apresentada não há corpos, apenas vestígios de corpos: numa casa de banho também ela idealizada, uma toalha azul cai pela parede de uma banheira branca e esvai-se num tapete vermelho-sangue. A bandeira da revolução – também criada por J.L. David – é evocada numa composição de apelo clássico.

Em Zeca o nome do cantor da revolução Zeca Afonso, surge-nos escrito com centralidade. Uma outra imagem clássica é evocada, já não pictórica mas fotográfica e cinematográfica, é para as recorrentes e ansiosas imagens de parques de estacionamento subterrâneos que a fotografia apresentada nos envia. A inscrição anuncia a saída do parque com um promissor Saída Zeca Afonso. Todavia, na fotografia, a saída apresenta-se-nos como uma parede cega, um enclausuramento.

Nas duas fotografias Marat e Zeca, a evocação simultaneamente histórica, poética e icónica, de diferentes histórias e geografias revolucionárias, já historicizadas pelo tempo e pelo pensamento, sublinham a sua atualidade como uma espécie de absurdo. Da revolução francesa restam as cores “Bleu Blanc Rouge”, da revolução dos cravos uma rua com o nome da sua voz.

O intervalo que separa Marat e Zeca, o espaço do que fica por completar entre as duas fotografias remete para o vazio mais contemporâneo da falta de ideais. O impasse. Afinal onde está a saída?

FICHA TÉCNICA

Marat, raw, lambda, moldura, 80 x 120 cm.

Zeca, raw, lambda, moldura, 80 x 120 cm.

Mostrado em:

2015, 10º Prémio Amadeu de Souza Cardoso, Museu de Amadeu de Souza Cardoso,  Amarante, Portugal

2014, IRI . Imagens do Real Imaginado, Revoluções, Biblioteca Almeida Garrett, Porto